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Leitura: Proteja seu Coração - VII

  • Gabriel Chico
  • 17 de out. de 2016
  • 6 min de leitura

A teoria de tudo

Autor: Sabrina de Ferreira


Publicação: Janeiro de 2016


Tema central: Drama, ação, filho adotivo e hospital


Páginas: 37


VII


Intitula-se por Ishmael Adias o homem que, depois de muitas tentativas vã de conseguir, legalmente ou ilegalmente, um coração para seu pai, um paciente cardiopata degenerativo, mantinha-se com o rosto cabisbaixo e frio dentro da banheira do casal. O apartamento, tecnicamente, pertencia à Annabeph Cartelano, entretanto, normalmente, o morador que mais passava tempo dentro do recinto era Ishmael. Isso não importava mais, no entanto, já que agora todos os enfermeiros e médicos que seguiram rumo ao local, agora estavam tirando do modo mais delicado de todos o corpo de Adias de dentro da banheira comprida.

Dentro do automóvel acinzentado escuro de Depp, Cartelano chorava, chorava o suficiente por dois em meio a tanta lamentação – seu bebê e ela. No banco de trás, pondo sua mão sobre a barriga, ela lamentava. Christopher ainda estava com seu amigo advogado dentro do hospital Abert Klein para caso ainda necessite deles. O doutor Bandeiras, ainda um pouco abatido com todo aquele relato que, com certeza, Depp terá de redizê-lo para a polícia, entrou no quarto de Meeiras para uma conversa franca e aberta com o próprio, antes deixando claro a Chris que lhe ligaria quando a operação cessasse.

– O que Christopher queria? – perguntou Emanuel antes mesmo de Bandeiras abrir sua boca.

– Veio me anunciar q-que... – a garganta do doutor pigarreou na tentativa vã de mencionar o nome do filho do policial ali deitado na cama de hospital a sua frente. – Anunciar que há um coração a espera para o seu transplante.

Um sorriso calmo apareceu no rosto de Meeiras, por um momento ele pensou em indagar o motivo de Christopher saber sobre um coração novo na lista dos pacientes cardiopatas, mas preferiu saborear o momento. Já haviam se passado alguns minutos entre o relato de Depp e a ida do doutor até a sala de Meeiras, minutos o suficiente para o corpo do indivíduo que lhe daria o coração chegar ao Albert Klein para o transplante imediato. Afinal, o tempo ideal entre a retirada do órgão doado e a chegada do coração no hospital do transplantado não pode passar de quatro horas. Um homem alto, moreno, com braços fracos e finos, com dentes brancos e óculos enormes adentrou a sala depois de duas batidas à porta fraca.

– Licença – disse. –, mas só falta o paciente para estarmos prontos para o transplante. – completou. Depois de agradecê-lo, Bandeiras mencionou algo que talvez pudesse mudar toda a trajetória daquela cirurgia:

– Será rápido e indolor, o senhor acordará com um novo coração, mas temos que agir de pressa. – fez-se uma pausa. – O doador do órgão chama-se...

– Não! – interrompeu Meeiras, ainda deitado. – Prefiro não saber o nome do infeliz... Ou da infeliz.

A frase de Emanuel Meeiras fez com que um pouco de saliva descesse pela garganta do doutor Bandeiras, que já estava o ajudando a sentar-se, à espera de enfermeiros que o levassem ao local do transplante de maca. “Mas o doador é...”, começou mais uma vez o doutor, tentando ajudá-lo de alguma forma a entender a gravidade de tudo que estava a sua volta. Ele estava cego, pensava o Bandeiras, e nem mesmo sabe disto. “Por favor, peço sigilo quanto ao nome do infeliz, ok?”, novamente Meeiras pôs-se a interromper. Sendo o doutor um homem que, como o mesmo diz, só fazer boas ações dentro de uma sala onde há um paciente e o próprio, ele decidiu fazer pouco caso e deixar que os desastres acontecessem naturalmente. Após dois minutos lentos de espera, Emanuel foi para a sala de cirurgia com um sorriso no rosto, não encontrando Christopher no caminho.

– Espero que dê tudo certo. – sussurrou Peter Van Bravo, o advogado amigo de Depp.

Chris e Van Bravo estavam ao lado do carro acinzentado escuro, ambos não conseguiriam permanecer dentro do hospital após vivenciar o momento do corpo de Ishmael chegar sobre uma maca, completamente coberto por um pano branco. Na verdade, só souberam que seria ele ali debaixo, pois o doutor Bandeiras pediu para que houvesse uma verificação facial do falecido homem. Ainda mais roxeado e ainda mais endurecido, foi à visão aturdida de seu melhor amigo.

– Pode voltar para a empresa, se quiser. Ainda está cedo e ainda há... – dizia Christopher, mas parou ao se lembrar de que aquela havia sido a última coisa que disse a seu amigo, “Ainda está cedo!” – Ainda há muito trabalho a ser feito por lá. Mas obrigada por ter vindo tão depressa só para ajudar um mero estagiário.

– Não há motivos para me agradecer. – sorriu Van Bravo. – Conte sempre comigo, você tem futuro na nossa empresa. E, veja bem, só vou embora porque sinto que minha presença não é mais tão importante como antes, mas qualquer coisa me ligue. Sem contar também que, você precisa de um momento a sós com a dama. – ele apontou com o olhar para dentro do carro, onde Annabeph ainda estava debulhando-se.

Após abraços e acenos de despedidas, Peter Van Bravo, o advogado com voz grossa, profunda e rouca, seguiu seu rumo à procura de um táxi disponível pelas ruas naquele horário quase noturno. A cirurgia devia estar em andando, porém o que preocupava Christopher era, logo depois de ter entrado no carro e conversado por alguns minutos, ter descoberto que Annabeph Cartelano estava à espera de um bebê de Ishmael Adias. Ambos não puderam conter, choravam abraços dentro do veículo acinzentado escuro. Pelo menos, pensava Depp, a geração de Adias não morrera.

– O que eu faço agora? – perguntou ela, chorando. – Eu iria contar a ele hoje...

– No futuro – tentou ele amenizar a dor de Anna. –, quando essa criança nascer e tiver consciência do ato de amor que o pai dela fez a seu avô, ela terá uma boa história para contar aos seus amigos.

Um pequeno riso saiu da boca de Annabeph, mas rapidamente transformou-se em um choro forte e doloroso no ombro direito de Christopher. A amizade entre Ishmael e Depp era forte o suficiente para uma vida inteira. Eles se conheceram no maternal e seguiram com essa amizade até os tempos de hoje, já Annabeph, o conheceu no colegial e desde então o relacionamento entre os dois era forte e duradouro. Christopher e Anna nunca foram muito chegados um ao outro, já que no início um sentia ciúmes do outro perto de Adias, mas agora, a história seria outra.

Depp passou seu corpo para frente do carro e acelerou, seguindo ao apartamento de Annabeph. Dentro do hospital, no entanto, a cirurgia seguia. Uma hora havia se passado e os médicos andavam de um lado para o outro em meio aos corredores vazios, cheios de culpa, arrependimentos e orações. O transplante, a qual passava agora Meeiras, começa com a abertura do peito do paciente. Em seguida, o sangue dele é desviado do coração doente por meio de duas cânulas, que são pequenos tubos, colocadas nas veias cavas, às duas grandes veias por onde o sangue entra no coração. Essas cânulas passam a conduzir o sangue para uma máquina ao lado da mesa de operação. Essa máquina de circulação extracorpórea funciona como coração e pulmões artificiais. A seguir, uma bomba devolve o líquido para o paciente por meio de outra cânula, que é ligada à aorta, que é a grande artéria por onde o sangue sai do coração para percorrer todo o corpo. Só após as veias cavas e a aorta estarem conectadas à máquina de circulação, é que o coração doente pode ser retirado.

Em seguida, colocam o novo coração – o coração de Ishmael. Os médicos costuram os principais segmentos do órgão doado às partes correspondentes do velho coração que permaneceram no peito de Emanuel. Quanto tudo já estava conectado, a circulação sanguínea do órgão foi restabelecida. Tudo isso ocorreu em cerca de quatro horas, e, normalmente após quinze dias de recuperação no hospital, o transplantado volta para casa com um coração novo no peito.

Emanuel, depois de os enfermeiros fecharem novamente seu peito e a anestesia ser usada, já estava em seu quarto tendo uns minutos a mais de sono. Todo esse tempo – dás quatro horas da operação – também foi útil para Christopher pôr na cabeça de Annabeph o quanto não ter pai era ruim sim, mas nada como ter bons amigos que a fossem ajudar. Se Depp não a conhecesse bem, pensaria que a mesma poderia estar somente pensando no futuro de um bebê esquecendo-se do passado que teve com um ótimo homem. Falando daquela maneira, ela não parecia lamentar a morte de um namorado, parecia lamentar a morte de um futuro pai – como quase um desconhecido.

Depp no banco da frente e Annabeph no banco de trás, sentada ao meio para que o mesmo tivesse ampla visão de seu rosto entristecido pelo retrovisor. Bufou ele pensando em como seu melhor amigo teria amado essa mulher agora sentada em seu banco traseiro. Mas era verdade, pensou Christopher, nunca tivemos gostos em comum. Pensando nesse assunto, ele acabou deixando com que uma pequena lágrima caísse, porém não foi nada que o mesmo não pôde disfarçar. No meio do caminho, ainda em meio ao trânsito horrível, quase não era possível se mexer, o celular de Christopher tocou.

“Alô?”

“Olá, aqui quem fala é o Doutor Bandeiras e ligo para dizer que Meeiras já podes receber visitas, mas ainda está sonolento e, talvez, quando chegarem ao hospital Albert Klein, já esteja dormindo.”

“Obrigada por realmente ligar, mas não iremos agora. Além do trânsito estar horrível, ele precisa de um momento para lamentar solitariamente a perda de seu único filho.”

“Sr. Depp, há um engano: não pude contar ainda o nome do doador.”

“Como?”, gritou Christopher frustrado.

Acompanhe o livro:

Agradecimentos e Esclarecimentos

Capítulo I

Capítulo II

Capítulo III

Capítulo IV

Capítulo V

Capítulo VI

Capítulo VII

Capítulo VIII

Epílogo

 

Baixe o texto em pdf: clique aqui.

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