top of page

Leitura: Proteja seu Coração - III

  • Gabriel Chico
  • 19 de set. de 2016
  • 8 min de leitura

A teoria de tudo

Autor: Sabrina de Ferreira


Publicação: Janeiro de 2016


Tema central: Drama, ação, filho adotivo e hospital


Páginas: 37


III

– Nada. – explicou Ishmael sem nenhuma expressão facial, tentando manter contato visual com seu pai adotivo, que estava sentado a quina da mesa marrom.

– Você estava fazendo exatamente... Nada? – ponderou Meeiras. Um mal-estar repentino deu-o a sensação de falta de ar complementado com uma tontura que o fez repensar se tudo isso valia a causa.

Constantemente, Emanuel experimentava um tanto dessas dores e sensações novas em horário de trabalho, sem saber ao certo o fundamento. Talvez fosse aquela sala intrigantemente parda e branca que o provocava, ou o seu patrão, o delegado com o nome mais renomado de toda a cidade, que pressionava demais e, às vezes sem motivos, afrouxava as rédeas, o deixando um tanto desequilibrado com a liberdade entre as cordas. Em partes, Meeiras sempre soube que sofrer de uma doença cardíaca degenerativa não o ajudava da maneira correta, para ser mais exato, não o ajudava em patavinas.

Tendo em vista que não era somente o próprio quem sofria, Adias também sentia na pele o que era ser filho de um homem na lista virtual da fila de espera de um famoso hospital do bairro para um transplante de coração imediato. Senhor Meeiras ainda não se encontrava em estado clínico avançado a ponto de pular certos indivíduos na lista, mas, mesmo assim, ele temia diariamente por sua própria vida. Quitou suas dívidas antigas, passou grande parte de seus bens e domicílios para o nome de seu único filho, Ishmael. Sem contar com pequenas quantias em dinheiro guardadas no banco, agora em nome de sua mãe, Malena, a qual também já se encontrava em um não tão bom estado de saúde.

– Nada, eu somente estava convers... – esclarecia Ishmael, mas a mente de Emanuel não estava no mesmo plano.

Ao pensar em como seria a sua vida a partir agora, olhando naqueles olhos negros e sobrancelhas extremamente grossas de seu filho adotivo, sentiu-se inseguro. Mas seus pensamentos logo se desvaneceram ao perceber que as dores pareciam aumentar. De súbito, uma pequena náusea invadiu o corpo de Meeiras. A sua coloração azulada fraca nas pontas dos dedos e unhas era um dos sintomas do fato de ser um paciente cardiopata, mas, nesse momento, a tal coloração só serviu para deixar suas mãos um tanto dormentes, mas isso não parecia ser um dos sintomas, apenas um mal-estar. Meneou devagar sua cabeça para os lados na tentativa de dispersar a dor, porém a ação pareceu atraí-la mais. Ishmael ainda dissertava sobre sua falácia, sem notar a estranheza em seu pai. E, de imediato, Emanuel foi ao chão.

Seu nariz tocou o solo como se fosse uma pequena pena jogava ao vento. Ishmael entrou em pânico, sua respiração ficou mais rápida e seu coração parecia querer saltar por qualquer buraco em seu corpo que ele achasse. Ajoelhando-se ao chão ao lado de seu pai adotivo, gritou por ajuda aos funcionários, que não demoraram muito para chegar e acudir. Adias sentiu-se sem estruturas ao ver Meeiras de tal maneira a sua frente. Depois de seu desmaio repentino na sala de seu trabalho, ele tinha acabado de se tornar prioridade na lista para um transplante de coração.

Arthur, um dos funcionários da delegacia e um dos melhores amigos de Emanuel, foi junto a Adias ao mais próximo hospital que encontraram. Inconsolável, Ishmael andava sorrateiramente ao lado da maca de seu pai, na esperança de vê-lo abrir os olhos. No entanto, um dos médicos do local ordenou que Ishmael não passasse pela porta branca e grande a qual a maca havia acabado de adentrar. Uma, duas... Três horas tinham se passado, mas nenhuma notícia sobre seu pai percorreu ao pé de seu ouvido. Arthur, o policial conhecido da família, já havia saído porta afora, precisava trabalhar. Já Ishmael, com sua cabeça latejando de tanto pensar numa possível morte ou numa simples recaída, sentado em uma das muitas cadeiras do corredor do hospital Albert Klein, segurava seu celular fortemente entre os seus dedos magros. O telefonema ao seu melhor amigo havia sido rápida, mas clara.

“Alô?”

“Vem para o A. Klein. Meu pai teve uma recaída.”

“Acharam um coração para o transplante?”

“Não...” sua voz parecia ter sido tomada pela decepção.

“Você achou um coração para o transplante?”

“Não.”

Minutos depois, talvez tenham sido até segundos, sem hipérbole, Christopher chegou ao Albert Klein de terno e gravata. Com seu topete baixo e raspado dos lados. Ele encontrava-se em seu trabalho temporário de estagiário em uma grande empresa, onde apenas circulava advogados e pessoas do ramo. Mas, naquele instante, ele via ao final do corredor Ishmael apreensivo perto da porta grande e branca do hospital que separava os pacientes dos demais. Ao notar seu amigo por perto, Ishmael ergue-se da desconfortável cadeira que o mesmo tentava utilizar. De pé, deu apenas alguns passos até estar entre os braços de seu melhor amigo, que o dava leves tapas amigáveis em suas costas.

Sentindo o afeto de seu amigo, Ishmael lembrou-se do momento em que a ajuda do mesmo foi crucial para um de seus loucos planos. Ambos estavam sentados ao chão, encostados a cama no pequeno cômodo do apartamento de Annabeph, a namorada, de olhos castanhos e pele branca como a neve, de Adias. O quarto era pequeno, porém era bastante futurístico. Existia uma janela grande que ficava entre o sofá e a cama; eram apenas três cômodos: a sala, que também servia como quarto, a cozinha e o banheiro. Todas as paredes consistiam em cores fracas e antiquadas, como o bege e o azul escurecido que predominavam todo o apartamento. Na porta de entrada tinha-se a visão de um sofá à esquerda, uma cama à direita, uma janela grande ao centro. Com uma televisão virada para o sofá em cima de uma estante e um aquário, com águas-vivas, virado para a cama. Ao lado da estante, tinha-se a porta para a cozinha e, ao lado do aquário comprido e largo, tinha-se a porta para o banheiro.

– Você quer mesmo que eu faça isso, Ish? – indagou Christopher com um dos seus olhos castanhos lacrimejando, sentado ao chão do apartamento.

– Se nada der certo... – afirmou Adias. – Sim, vou querer.

As três primeiras lágrimas caíram do rosto de seu amigo. Christopher Depp usava calça jeans colada a sua pele, com uma blusa branca totalmente parda e larga. Seu tênis de marca era preto, mas seu relógio era sem marca, e sem cores. Ishmael tentou não reparar muito no estilo de vestimenta de seu melhor amigo no momento, já que toda aquela conversa era bem delicada e complexa para ambos. Limpando suas próprias lágrimas e ajeitando a blusa parda, Christopher suspirou ao falhar na tentativa de achar uma saída, em seus pensamentos, menos dolorosa daquela situação a qual seu amigo passava. Mas era impossível, Ishmael lamentavelmente sabia muito bem disso.

– Se você quer assim... – desabafou Depp, admitindo a si mesmo nada poder fazer.

Inesperadamente, Ishmael deslocou seu amigo inconsolável para um forte abraço enquanto ambos persistiam sentados no chão do cômodo do apartamento da namorada de Adias. Christopher não concordava com a parte que Ishmael o deu no plano mais louco que ele já havia ouvido, mas, por ser um amigo quase irmão e um confidente de anos, ele aceitou a sua parcela de culpa gratuita que Ishmael o oferecera, para caso alguma eventualidade ruim ao mesmo aconteça – entretanto, isso ainda é uma parte da história a qual Adias confidenciou apenas para ele e seu melhor amigo, mas ninguém.

O mesmo abraço que ambos deram entre si, dentro do apartamento de Annabeph, era tão forte e tão verdadeiro quanto o que os próprios reproduziram dentro do hospital Alberto Klein naquele momento. Os olhos de Ishmael, dessa vez, foram os que mais produziram água, todavia, como o bom amigo que Christopher sempre foi, tratou logo que ordena-lo a “engolir o choro” e erguer a cabeça, pois seu pai ainda estava bem, o que era algo muito bom. Sem notar, o doutor, que insistiu para que Ishmael retornasse e sentasse em um dos bancos para não atrapalhar o atendimento ao paciente do outro lado da porta branca, já estava entre eles esperando o término do abraço.

– Sim? – perguntou Depp, o único que havia reparado a chegada do Doutor.

Os olhos do doutor pareciam de vidro, mas eram apenas incrivelmente azul-claros. Sua pele era parda, quase branca. A barba do mesmo deixava a pequena e insegura barba ainda em evolução de Ishmael com um pouco de inveja. O cabelo do doutor era liso, mas ondulado nas pontas. Raspado dos lados, ele possuía apenas na parte central. Com um jaleco branco feito neve, uma prancheta com anotações em uma mão e na outra uma cante azul esferográfica. Seu olhar incrivelmente azul claro estava direcionado a Adias.

– Olá, sou o Doutor Bandeiras e... Sobre o seu pai, ele está melhor, mas terá que passar vinte e quatro horas conosco, somente por precaução. O coração do Senhor Meeiras teve uma pequena dificuldade para bombear sangue, ele está fraco demais. – lamentou o Dr. Bandeiras. –Do jeito que está, infelizmente devo alertar que resto apenas a ele algumas semanas, duas talvez. – confirmou lentamente. – Meeiras já possuí o Pager? – Saber que seu pai poderá ter apenas duas semanas ou mais – ou menos – de vida, poderia ter deixado Ishmael assustado ou, até mesmo, triste. Mas essa era uma notícia que o próprio já havia ouvido de outros médicos anteriores a este.

Um Pager, também pode ser chamado de bip, bipe ou radiomensagem, é um dispositivo eletrônico usado para conectar pessoas através de uma rede. Quando o mesmo apitasse em grande som, significaria que um coração estaria pronto para o transplante de Emanuel Meeiras. Ainda mais agora que, após essa recaída em seu estado clínico, ele passou alguns nomes da lista de indivíduos para um transplante de coração. Com isso, Adias afirmou com um balanceio de cabeça para o Doutor Bandeiras dizendo com incerteza. “Deve estar em cima da mesa de trabalho dele, sempre esquece por lá.” Então o médico, que, usando palavras curtas e grossas, deixou bem claro que Meeiras poderia receber visitas, porém o mesmo permanecia dormindo neste momento, então, de nada adiantaria. E pediu, com um pouco de educação, para que ambos os homens retirassem-se do local, pois no momento oportuno, ligaria dando notícias.

Do lado de fora do hospital Albert Klein, vendo pessoas doentes e crianças catarrentas, Ishmael alertou:

– Lembra quando eu disse... Que se nada desse certo... – falava lentamente sem fitar seu amigo. – Você teria de...

– Eu sei disso, Ish. Não precisa me relembrar. – O silêncio pairou sobre ambos. Christopher tinha respondido seu amigo grossamente pelo simples fato de não querer arcar com tais ordens, mas era em vão todo esse esforço de lutar contra, pois Ishmael já estava decidido. Pensando nisso, bufou para os céus e perguntou amigavelmente: – Quer que eu leve você para a casa?

Suspiros e abre e fecha portas logo depois, Adias sentiu-se impreenchível ao ver seu amigo vagarosamente sair com o carro da frente do hospital, virando a minha esquina que encontrou no caminho. O coração batendo de Ishmael era o único som que ele ouvia agora, além da música lenta que soava do rádio de Chris, como se aquilo, de algum modo, o fizesse sentir-se bem. Admirando os buracos no chão da entrada do hospital Albert Klein, Ishmael decidiu ligar – ou entrar em qualquer meio de comunicação possível – para achar tráficos de órgãos.

Acompanhe o livro:

Agradecimentos e Esclarecimentos

Capítulo I

Capítulo II

Capítulo III

Capítulo IV

Capítulo V

Capítulo VI

Capítulo VII

Capítulo VIII

Epílogo

 

Baixe o texto em pdf: clique aqui.

Kommentare


Posts recentes
Siga-nos nas redes sociais
Editoras
Destaques
Tags
Dicas Rápidas

© 2016 por Livros que Li & Gostei

  • Facebook Social Icon
  • Twitter Social Icon
  • Instagram Social Icon
  • Tumblr Social Icon
bottom of page